As bolas de gude estão presentes em vários aspectos da cultura e da história cariocas. Até a década de 1970, a brincadeira rolava em todo o Rio, principalmente, nas regiões mais periféricas e nos bairros menos urbanizados. Hoje, são as crianças das zonas norte e oeste que mantêm viva a tradição.
Bola de gude pode ser definida como uma pequena bola de vidro maciço, pedra ou metal, normalmente escura, manchada ou intensamente colorida, de tamanho variável, usada em jogos infantis. É conhecida por tantos nomes diferentes, que fica até difícil lembrar: berlinde, burquinha, burca, baleba, bila, biloca, bilosca, birosca, bolinha, bolita, boleba, bolega, borroca, bugalho, búraca, búlica, búrica, bute, cabiçulinha, carolo, clica, firo, fubeca, guelas, nica, peca, peteca, pinica, pirosca, mangalho, bolinha, piripiri, xingaua, kamikaze, ximbra e bolíndri. Esquecemos de algum?
Há várias formas de jogar bola de gude, mas o objetivo não muda muito: com um impulso do polegar, atira-se uma bolinha, a fim de atingir um alvo marcado previamente (triângulo, buraco etc.). As jogadas podem ser feitas de perto, de longe, de uma vez só ou aos petelecos, e as modalidades com buracos requerem chão de terra – as com desenho de giz podem ser jogadas em chão de pedra ou cimento.
Durante a Ditadura Civil-Militar, estudantes usaram o jogo para se proteger contra a repressão da cavalaria nas passeatas em oposição ao regime. De um lado, cassetetes e chutes de coturno, de outro, apenas bolinhas de gude derrubando cavalos.
Os jogos são tão variados quanto os nomes que a bola de gude recebe, mudando de cidade para cidade, de rua para rua, de acordo com a criatividade das crianças, dos adolescentes e mesmo dos adultos. Aqui, vamos falar sobre os três principais, a búlica, o zepê e o triângulo.
Búlica
Para praticar o mais famoso dos jogos de bola de gude, é preciso que se cavem na área de terra três covas pequenas e pouco fundas, que são as búlicas (ver figura acima). O número de jogadores pode variar, mas para ficar mais ágil, o ideal são cinco. A partida pode ser “à vera”, quando o vencedor leva para casa as bolas de gude dos adversários, ou de brincadeira, no qual o campeão só leva o mérito de ser o melhor. Para começar, os jogadores atiram suas bolas de gude em direção mais afastada. Durante a preparação, quem gritar primeiro “marraioferidor sou rei” será o último a jogar e levará a vantagem de ter mais bolas no campo. Os outros jogadores deverão gritar “segundo”, “terceiro”, “quarto” e o que gritar por último será o primeiro a jogar a bolinha. A partir do segundo, qualquer participante que ferir a bola de outro jogador ganha o direito de iniciar o jogo.
As variações: Zepê e Triângulo
No zepê, os jogadores definem se será “à vera” ou de brincadeira, depositam os prêmios (bolas de gude ou dinheiro) na figura desenhada no chão e riscam, a uma distância de três metros, uma linha reta na terra. Cada participante joga a sua bola em direção à linha e dá início ao jogo aquele que chegar mais perto. O grito de “marraio feridor sou rei” oferece a mesma vantagem que na búlica, começa quem for o último a ferir a bola de um outro jogador e a brincadeira termina quando todos os objetos do zepê acabarem.
Já o triângulo é uma variação do zepê, com as mesmas regras, mudando apenas a figura onde são colocadas as bolinhas e moedas. Uma versão do jogo foi criada para épocas de chuva, já que a terra molhada dificultava a prática da bola de gude. Os jogadores desenhavam o triângulo na terra e riscavam a linha reta para verificar quem jogaria primeiro, mas as bolas serviam apenas para definir quem começaria o jogo. Os participantes tinham em mãos um espeto de ferro ou de bambu com a ponta afiada, e a brincadeira consistia em cravá-lo na terra, andando em direção ao triângulo. Que criatividade!